quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Viajando com fones de ouvidos...

Outro dia passando por uma rua bem movimentada perto do meu trabalho, presenciei uma cena cujas imagens me acompanharam por dias. Uma recolhedora de recicláveis "pilotava" seu veículo (carroça) conduzido por si mesma, movido pelo combustível de seu esforço, no lado direito destinado aos veículos automotores, movidos por combustível fóssil ou renovável. Trajava roupa que a protegia dos raios ultravioletas, sem ter se descuidado do chapéu, com abas consideravelmente largas. Na hora pensei no risco que corria, pois estava transitando numa via destinada a carros, motos e caminhões. Qualquer motorista distraído podia provocar um acidente grave.
Mas o que mais me surpreendeu foi que aquela mulher usava fones de ouvidos. Isso mesmo, fone de ouvidos! Aqueles mesmos que usamos para ouvir músicas enquanto trabalhamos ou fazemos atividade física, ferramenta para distração ou motivação. Esse foi o motivo principal daquela mulher ter chamado a minha atenção. Pessoas assumindo pequenos riscos estou acostumado a encontrar nas ruas aos montes. Mas correr risco com tanta tranqüilidade (ou indiferença) me causou impacto mesmo depois de tê-la perdido de vista ao retrovisor. O que estaria passando pela sua cabeça? Para que lugar a canção a estaria levando? Estou quase certo de que se ela tinha alguma preocupação não era com a possibilidade de ser atropelada. Imagino que ela deve ter deixado em casa os motivos de sua árdua tarefa diária: família (filhos, companheiro, cachorro etc). Também imaginei que canção estaria ouvindo. Para onde estaria indo. Que já tinha um itinerário a cumprir e que se resignava ao trabalho digno, mas estafante, que lhe dá a condição de cidadã que não fica à espera da oportunidade, mas se levanta com criatividade e age.
Imaginei mais ainda, que como não ouvia ruídos dos motores e das buzinas, se orientava também pelos vultos e pelo vento quente das máquinas velozes e furiosas que a ultrapassavam. 
Queria seguir aquela mulher por algum tempo para invadir um pouco sua privacidade, e tentar descobrir algo mais de sua história. Mas certamente eu ainda não pertenço ao seu ritmo. Estou do lado de cá. Do lado das coisas óbvias, calculadas, aparentemente seguras. 
Despedi pedindo a Deus que a proteja, que seus "anjos da guarda" estejam sempre ao redor daquela guerreira anônima, como acreditamos estarem ao lado das crianças inocentes.